sábado, 16 de janeiro de 2010

.. a perda de um grande amor - Conto I



Uma hora da manhã, a xícara de café vazia na beira da cama desarrumada marca o começo de uma profunda insônia na madrugada que dará origem a uma segunda-feira pior que todas as outras que já passou.
Menina moça de vinte e poucos anos, deitada em sua cama agora vazia, com seu fone que levava aos seus ouvidos, a todo volume, uma música suave e delicada, exatamente como a noite em que a escutou pela primeira vez. Em sua cabeça um filme em preto e branco dos momentos que nunca voltarão, não importa quantas lágrimas escorram ao ritmo sensível ou quantas noites, de cama vazia, virão; aquela música nunca mais voltará a tocar como antes.
Durante toda a noite se via, pelo lado de fora, a mesma cena, aquele moça sentada, meio jogada chorando ao som da mesma música sussurrada em seus ouvidos. A luz cada vez mais escura devido a vela que já chegava ao seu fim aos poucos foi sendo substituída pela luz do sol que ia nascendo, se escondendo atrás das nuvens cinzas. Quando o relógio apitou às 7 da manhã ela já estava vestida com seu manto negro, se levantou com certa dificuldade de sua cama e pegou a chave do carro que estava em algum lugar pelo chão. Dirigia devagar, como quem não pretende chegar, seus olhos inchados e a forte chuva que começava a cair serviram de obstáculo para ela que queria seguir. Parou em frente a uma floricultura, atravessou a calçada sem medo de se molhar e ao entrar pediu uma rosa do amor, a rosa vermelha mais viva que se tinha. Suas lágrimas se intensificaram com a chuva, com um esforço quase sobrenatural lutava contra a vontade de voltar, e cada segundo mais perto pior era a dor que pressionava seu peito, pior era a realidade que enfrentava.
Passou por um portal de estilo gótico, avistou uma mini procissão que tinha começado sem ela, não esperava que o fizessem já que ninguém a conhece. Pegou a rosa e deu  passos apressados e se juntou aos poucos familiares e amigos que iam atrás de uma bonita caixa de madeira que levava dentro o amor que pensou ser para a vida inteira. Aquelas pessoas a olharam e seguiram sem dizer nada com a pergunta ecoando em suas cabeças, “quem seria essa menina?”. Mas ela conhecia todos, cada um com sua individualidade, ela sabia que a mulher que andava a passos cambaleantes a primeira fila era a melhor cozinheira do mundo e que o homem que sustentava aqueles passos tortos com um abraço sobre o ombro era o pai que todos deviam ter. Ela sabia por que esse rapaz, que já não respira seu ar, a dizia, falava alegre e sorridente de sua família enquanto deitava o corpo sobre o seu.
Aos poucos se aproximavam de uma grande cavidade no meio daquela grama verde, em pouco tempo toda aquela gente estava ao redor e olhando aquele buraco  como se fosse o fim, não só de uma vida, mas de alguns outros que, de tão fracos e desmotivados, queriam cair junto com ele ali dentro. Com os pés na lama e de olhos fechados escutou verdades e mentiras de um padre e sua bíblia. Seus vinte e poucos anos a deu coragem de levantar a cabeça e caminhar para o mais próximo que se podia chegar daquele lugar,  que agora seria o lar de sua vida, soltou a rosa mais viva e sorriu triste para aqueles olhos fechados que apareciam pelo pequeno vidro. Virou-se para ir embora, e a metade do caminho escutou seu nome sendo chamado, era uma pronuncia cheia de dúvidas de alguém que não tinha certeza que esse nome a correspondia. Olhou para trás e viu o pai que vinha, o esperou para saber o que queria.
            - Quero lhe dizer que o último suspiro de meu filho veio em forma de palavra meio cantada, em forma de nome que ninguém conhecia. Chorou como quem chora uma dor por primeira vez e pediu para que lhe falasse que a amava desesperadamente e que sentia muito por nunca ter dito os seus sentimentos, e que se pudesse voltar no tempo seria tudo diferente, que você foi e será a única e perfeita mulher que ele já teve! – disse o pai.
A garota voltou para casa e se deitou na mesma cama bagunçada, mas dessa vez do lado em que um dia deitou seu amado, e respirou o perfume que sobrou perguntando-se o que sobraria de si.